Meu dilema se anuncia sempre que ouço o barulho das ondas se quebrando,
o canto de pássaros, ou vendo vegetações soçobrarem naquilo que chamam de chão.
Na verdade sinto náuseas quando me apoio em terra firme, dói minha alma
atracar portos, não sou daqui... Pertenço ao mar!
As sociedades me entontecem, por seus caminhos, campos e rotas,
pessoas que navegam apressadas sempre pelos mesmos lugares, uma rotina que
enlouquece e cria sonhos distorcidos. Pergunto se essa loucura que toma
vagarosamente as pessoas exerce algum tipo de prazer. E se exerce, será ele tão
vicioso que elas não percebem a sua escravidão?
Suas embarcações e cabines de dormir que não se movem, altas
edificações iluminadas, onde pessoas se aglomeram, moram uma acima da outra, ou
não moram, quase se trombam, mas, não se veem, não se sentem e nada sentem, não
há desprezo, indiferença, ódio ou rancor, simplesmente nada sentem. Estão
envoltos de uma total solidão, uma mistura de pânico e medo, a todo o momento
são visitadas por seus fantasmas pessoais. O ceticismo das cidades não se
voltou apenas contra seus deuses e crenças, a ausência de fé está hoje contra o
próprio ser humano.
Chego já com saudade de minhas águas firmes, a meu Deus levanto as
velas e peço que os anjos me soprem para lugares cada vez mais distantes
daqui.
Não nego que eu não tenha meus fantasmas, como eu poderia. No mar
também existem tormentas, tempestades e coisas inimagináveis. Já naufraguei,
sofri e fiz muita gente chorar, já amei e me deixei amar ao longo de minha
vida, e certamente o destino me pregará peças ainda piores. Porém, sou dono de
meu leme e navego minha vida, tendo como bússola a minha alma. E não existirá
piratas, sereias ou dragões que podem me impedir de ser feliz, e nada vai
impedir que eu levante a minha âncora e parta. Fazendo com que meu coração
navegue e voe por esse mar.
Aos céus levanto os meus braços e de joelhos agradeço pela imagem
da janela não ser sempre a mesma, é impossível viver assim. O mar me refugia em
horizontes vazios. Aqui eu passarei a minha vida inteira. Nesse ponto também
tenho como companheira a solidão, porém, essa é uma solidão sincera, e perante
a falsidade do mundo, prefiro continuar ouvindo somente a minha própria voz.
Esperando as luzes de outro porto, desejando... temendo o que eu mais odeio.
Raphael G. Norberto
In: raphaelnorberto.blogspot.com
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